sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Geração Fodida

exercício Crónica 'versus' Coluna de opinião - aqui, e pegando num primeiro texto resultante do exercício sem QUE, a Rita opta pelo primeiro género, desenvolve e produz uma crónica poderosa.
Posso dizer uma coisa fora do contexto? Devaneios contam? Não há contexto para os devaneios. Podem não ter sentido e podem ser ditos a qualquer momento, menos a meio de um jantar romântico à luz das velas, podemos parecer loucos e acabar por dar cabo do ambiente. Por falar em romântico, qual é o antónimo dessa palavra? Não me ocorre nada de momento, mas falemos disso mesmo.
Hoje em dia, ainda conseguimos encontrar resquícios de um pensamento conservador. O mais flagrante será o da imagem do homem como chefe de família, ou seja, o detentor do poder. Mas cada vez mais as mulheres reclamam esse estatuto e tomam as rédeas da vida sexual. Agora, alguém me explique a razão pela qual isso faz de nós, mulheres, umas putas e vocês, homens, uns garanhões? Quer dizer, eu não posso, portanto, ter vários namorados porque sou logo vista como “aquela-com-quem-não-devemos-casar”. Se estivéssemos em Hogwarts, eu seria, então, “aquela-cujo-nome-não-deve-ser-pronunciado”. Pois é, estas categorizações não deixaram de existir. Já ninguém nega o facto de todos termos necessidade de ter relações sexuais mas uma mulher que possa desenvolver um comportamento sexual “de homem” é que não!
Todos sabemos que, nos últimos tempos, as relações amorosas têm vindo a sofrer mutações. Antigamente, o sexo era a última etapa de um longo percurso de conversinhas, cineminhas, jantares, no fundo vendas de sonhos (como um bom marketeer sabe fazer). Hoje em dia, atrevo-me a dizer que é precisamente o contrário, isto é, começamos pela cópula e só depois disso poderá ou não haver uma consolidação de acordos. Certo é que, em muitos casos, não chega a haver uma segunda saída. Às vezes, há relações que podem durar um pouco mais, até ao dia em que surpreendentemente, chegam ao fim. “Puff” desapareceu! Para onde é que ela foi? Questionemo-nos a nós próprios, o que é que procuramos afinal? Eu não sei a resposta, nem é esse o propósito desta crónica. Por enquanto, a única coisa que sei é que gostamos do rótulo, mas quase nunca da embalagem toda. Podem agradar-nos parcelas que constituam “X” ou “Y” - chamemos-lhes “Ana” e “João”, respectivamente - mas não gostamos deles ao ponto de abdicarmos as nossas vidas. Olhem o exemplo do suicídio por amor, também deve ter caído em desuso, assim como todo o romantismo. “-Ai não queres nada comigo? Pfffff…tu é que perdes!”. Não é assim que fazemos agora? Os relacionamentos afectivos de hoje são como as pilhas que compramos nas lojas dos chineses, duram muito pouco. Aquilo que conhecíamos por “amor romântico” faz parte da velha guarda, não está mais na moda. Como alguém disse e bem, “As relações de exclusividade são a excepção, não a regra”. Perante isto, com que confiança é que posso entregar-me a alguém? Nós não somos a geração perdida, somos a geração fodida. E não, criancinhas, a Bela nunca há-de apaixonar-se pelo Monstro, a não ser que ele a salve de uma vida de infortúnios mas, para isso, terá que ter um bolso bem fundo. Em oposição ao que se costuma dizer parece que, para muitas pessoas, mais vale estar mal acompanhado do que só. Se, outrora, fazíamos colecção de discos vinil, hoje compilamos novelas mexicanas. A Bela Adormecida já não é mais salva de um estado de semi-coma, com a ajuda de um príncipe encantado que lhe furta um beijo e a faz acordar para a vida. Não. A história, que conheço, mais parecida com esta é de uma amiga minha, a Joana, que acordou de um coma alcoólico, com um linguado de um desconhecido e que não a fez acordar para a vida, como a Bela, mas simplesmente a vomitar. Não me parece muito romântico. Aliás, nada disto parece, mas esta é – desculpa, Al Gore – a minha verdade inconveniente.

Rita la Rochezoire

1 comentário: