01 – INT. BAR NOITE
Numa noite seca de verão, entra num bar um homem dos seus 30 anos vestindo uns calções de futebol do Benfica, pullover da Nike e tennis com meias até ao joelho. Ele vem transpirado, a arrastar os pés e a olhar para o chão. Senta-se ao balcão e pede um gin tónico.
O barman, um homem de 50 anos e com um ar bastante simpático, que já tinha pensado não deixá-lo entrar devido ao seu vestuário desadequado, serviu-lhe a bebida porque o bar estava vazio e apetecia-lhe alguma conversa para animar a sua noite.
.
BARMAN
Desfrute desse gin. Mas com calma.
Numa noite seca de verão, entra num bar um homem dos seus 30 anos vestindo uns calções de futebol do Benfica, pullover da Nike e tennis com meias até ao joelho. Ele vem transpirado, a arrastar os pés e a olhar para o chão. Senta-se ao balcão e pede um gin tónico.
O barman, um homem de 50 anos e com um ar bastante simpático, que já tinha pensado não deixá-lo entrar devido ao seu vestuário desadequado, serviu-lhe a bebida porque o bar estava vazio e apetecia-lhe alguma conversa para animar a sua noite.
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BARMAN
Desfrute desse gin. Mas com calma.
O homem abana a cabeça afirmativamente com um certo desprezo, sem olhar para o barman.
BARMAN
Olhe, ainda há uns anos um rapaz entrou aqui assim também transpirado, pediu uma coca-cola com gelo e tal foi a pressa que a bebeu que não lhe duraram mais de 2 minutos de vida.
O homem continua a ignorá-lo e empurra o limão para dentro do copo como se o estivesse a afogar.
Olhe, ainda há uns anos um rapaz entrou aqui assim também transpirado, pediu uma coca-cola com gelo e tal foi a pressa que a bebeu que não lhe duraram mais de 2 minutos de vida.
O homem continua a ignorá-lo e empurra o limão para dentro do copo como se o estivesse a afogar.
BARMAN
Mas anime-se senhor! Com este calor você não devia de andar a jogar à bola. Quer dizer, suponho que seja à bola. Esses calções do nosso gloriosos não enganam.
HOMEM
Foi à bola sim.
BARMAN
Pois supus que sim. Mas com este tempo é melhor estar aqui com o ar condicionado a ler um livrinho.
Mas anime-se senhor! Com este calor você não devia de andar a jogar à bola. Quer dizer, suponho que seja à bola. Esses calções do nosso gloriosos não enganam.
HOMEM
Foi à bola sim.
BARMAN
Pois supus que sim. Mas com este tempo é melhor estar aqui com o ar condicionado a ler um livrinho.
O homem faz um ar surpreendido, incrédulo que um barman leia livros. O Barman mostra-lhe o
livro Caim do Saramago.sermão, entra:
BARMAN
Agora tou a ler o último, infelizmente.
Agora tou a ler o último, infelizmente.
O homem surpreende-se ainda mais pois o Saramago é o seu escritor favorito. No entanto continua a olhar para o copo e a espetar o limão continuamente. O barman começa a limpar os copos e o bar.
HOMEM
É o meu autor favorito... Eu por mim vou nas intermitências da Morte.
BARMAN
Gostei, mas não é dos melhores. Acho que com a morte não se brinca e nunca se sabe o que é que ela nos prepara. Vai na volta, foi isso que aconteceu ao Saramago.
HOMEM
Pois, foi andando para a terra santa. Daqui a nada vou ver como é a Terra do Pecado.
BARMAN
Vai ler esse?
É o meu autor favorito... Eu por mim vou nas intermitências da Morte.
BARMAN
Gostei, mas não é dos melhores. Acho que com a morte não se brinca e nunca se sabe o que é que ela nos prepara. Vai na volta, foi isso que aconteceu ao Saramago.
HOMEM
Pois, foi andando para a terra santa. Daqui a nada vou ver como é a Terra do Pecado.
BARMAN
Vai ler esse?
O homem pára de agitar o limão e fica a olhar para ele estupefacto com a burrice de um homem tão supostamente inteligente que lê Saramago.
HOMEM
É, vou... o seu favorito por acaso não é o ensaio sobre a cegueira, não?
BARMAN
É bom. Mas prefiro o Memorial do Convento.
Há um silêncio. O homem está mais agressivo com o limão. O barman observa com mais atenção e começa a perceber as dicas do homem, franzindo as sobrancelhas. Fica um pouco em pânico sem saber se a sua suposição é uma invenção da sua cabeça. Decide jogar o mesmo jogo.
HOMEM
É, vou... o seu favorito por acaso não é o ensaio sobre a cegueira, não?
BARMAN
É bom. Mas prefiro o Memorial do Convento.
Há um silêncio. O homem está mais agressivo com o limão. O barman observa com mais atenção e começa a perceber as dicas do homem, franzindo as sobrancelhas. Fica um pouco em pânico sem saber se a sua suposição é uma invenção da sua cabeça. Decide jogar o mesmo jogo.
BARMAN
Ouça... por acaso não sabe quando foi o Ano da Morte de... Ricardo Reis?
O homem pára de mexer o limão e decide ir-se embora, começando-se a levantar da cadeira. Bebe um golo grande.
Ouça... por acaso não sabe quando foi o Ano da Morte de... Ricardo Reis?
O homem pára de mexer o limão e decide ir-se embora, começando-se a levantar da cadeira. Bebe um golo grande.
HOMEM
1936, porquê?
BARMAN
Nada, nada...
1936, porquê?
BARMAN
Nada, nada...
O barman limpa os copos mais devagar e mais pensativamente.
BARMAN
Mas não está a pensar fazer A viagem do Elefante, não?
Mas não está a pensar fazer A viagem do Elefante, não?
O homem percebe que foi apanhado e bebe o copo com golos ainda maiores. O barman aproxima a cara ao homem.
BARMAN
Não vai ter que ser Levantado do Chão pois não?
Não vai ter que ser Levantado do Chão pois não?
O homem acaba de beber o copo, levanta-se sem dizer nada e dirige-se para a porta. Barman grita em desespero de quem sabe o que vai acontecer.
BARMAN
Sabe que a Pilar foi fundamental na carreira de Saramago!
Sabe que a Pilar foi fundamental na carreira de Saramago!
O homem pára à porta dirigido para a rua.
BARMAN
Eu posso ser a tua Pilar.
O homem vira-se e olha para o Barman.
Eu posso ser a tua Pilar.
O homem vira-se e olha para o Barman.
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